Uns dois meses atrás, a Globo entrou em uma celebração mega elaborada para comemorar os 60 anos da emissora + os 100 anos do Grupo Globo. Praticamente toda a grade ficou temática durante semanas, com programas fazendo referência uns aos outros e vários especiais para relembrar personagens, músicas e cenas marcantes (e eu, como boa nostálgica, passei praticamente um mês inteiro presa na TV — então dá para dizer que eles acertaram nas homenagens).
PORÉM. Ah, porém. Saiu também uma lista elencando as 60 melhores novelas já exibidas na emissora. Com votação de júri especializado e tudo, matéria super bonitinha com efeitos de frufru na tela.
E eu não poderia discordar mais do resultado. Pior, eu acho que algumas das posições ali são quase um crime contra o noveleiro médio. Não quero saber se isso aqui é uma democracia, eu me senti OFENDIDA por essa lista e penso nela diariamente desde o dia 24 de abril, quando li a dita cuja enquanto soltava o ar com força pelo nariz.
Por isso, fiz a única coisa possível e, hoje, trago para vocês a minha própria lista — Melhores Novelas da Rede Globo by Fernanda Castro, o que eu espero que seja uma contribuição de inigualável relevância para a história da teledramaturgia brasileira (a verdade é que fiquei de férias hoje e prometi a mim mesma que ia gastar meu tempo com algo muito inútil mas que me divertisse horrores).
Precisei dividir a news em duas partes porque cheguei ao limite de caracteres do e-mail, kkkrying. Mas, antes de começar, algumas considerações importantes:
Vou elencar apenas as minhas 33 favoritas porque eu tenho 33 anos e até parece que eu já vi mais de 60 novelas nessa vida (embora talvez tenha visto). Isso significa que há um viés claro de época. Novelas ali dos anos 70/80 que, tenho certeza, foram muito boas, ficarão deixadas de lado a menos que tenham feito sucesso no Vale a Pena Ver de Novo.
Sendo a única jurada da lista, é óbvio também que ela segue minhas próprias preferências. É importante você saber que eu não sou uma telespectadora assídua de novelas das 7 porque não curto muito humor pastelão e tramas mais jovens/contemporâneas. Já vou deixar aqui meu respeito a Kubanacan e Uga-Uga pela contribuição ao nonsense brasileiro, mas as duas não vão figurar na lista.
Não estou considerando superséries ou as novelas especiais que passaram em streaming ou fora dos horários consagrados.
Novelas CAGADAS porém MARCANTES têm seu mérito. Se você ainda lembra do bordão de um personagem depois de anos e comentava sobre a novela até com o dono da padaria, então ela é uma boa novela.
Eu não gosto de A Favorita — sim, é um defeito meu.
E aí, vamos? Não sei você, mas eu estou nervosa.
33 — A Viagem
Talvez a presença dela aqui esteja sendo influenciada pela reprise atual, mas é preciso respeitar o que Guilherme Fontes interpretando Alexandre de roupa preta fez pela cultura de memes do país. A história em si acho pouco memorável (e você vai descobrir mais na frente que não curto muito o Fagundes como galã), mas não dá para negar que A Viagem virou um símbolo reconhecido por 9 a cada 10 brasileiros.
32 — Um Anjo Caiu do Céu
Cachinhos do Caio Blat. Cenas no céu feitas de isopor e algodão. Tinha o Supla. Tinha a Angélica. Henri Castelli de uniforme. Preciso dizer mais alguma coisa? (Aliás, eu poderia substituir Um Anjo Caiu do Céu por Esplendor, que tinha o Caio Blat andando de lambreta e o Henri Castelli com uniforme retrô — você nem notaria a diferença).
31 — Andando nas Nuvens
Foi uma boa novela? Não, mas achei justo representar aqui as raras novelas com protagonistas 50+ (e a atuação do Marco Nanini era a coisa mais legal dessa história). Andando nas Nuvens pode ser considerado uma irmã de Zazá (essa protagonizada pela maravilhosa Fernanda Montenegro, porém igualmente esquecível). Além do mais, a novela tinha lá seu componente de ficção científica. Você queria ver Kubanacan por aqui? Vai ter que se contentar com Andando nas Nuvens.
30 — Torre de Babel
Incluída na lista única e exclusivamente por ter explodido um shopping em cena. O shopping se chamar TROPICAL TOWERS é um bônus delicioso de irreverência e breguice. Eu gosto muito de novelas que criam um mistério para o público, e tanto a cena da explosão quanto descobrir quem era o responsável por isso foi um assunto que rendeu demais no Brasil. Imagino que um remake lidaria de forma mais sensível e menos capacitista com o personagem Jamanta, mas ele com certeza é dono de um bordão consagrado que vamos lembrar para sempre.
29 — Coração de Estudante
Bola de meia, bola de gude, o solidário não quer solidão. Toda vez que a tristeza me alcança, o menino me dá a mão.
Para além da abertura simplesmente perfeita que você vai cantar junto quer queira quer não, Coração de Estudante foi uma daquelas novelas afetivas. Ela dava quentinho no peito, ela era como tomar um cafezinho. Eu tenho até medo de rever e descobrir que envelheceu mal. Lembro que essa novela também foi uma revelação para mim em termos de gostar de personagens cinzentos, porque me irritava o tanto que todo mundo era BONZINHO.
28 — América
Deborah Secco precisava MUITO chegar nos Estados Unidos, e o Murilo Benício consegue ser bom em qualquer papel, até mesmo naqueles que claramente não foram feitos para ele. Rir da novela era uma experiência mais legal do que a novela em si, mas eu gostava da ambientação peão de rodeio, fivelão e tal — importante lembrar que América passou bem antes de o sertanejo ser cooptado pelo agrofascismo. E tinha o Touro Bandido!!
27 — Mulheres de Areia
Hollywood sonha em ter uma atriz como a Glória Pires para interpretar gêmeas. Era icônico, era arquetípico — Ruth e Raquel estão sacramentadas no imaginário brasileiro, assim como Tonho da Lua e seus bordões. Você batia o olho e sabia qual era qual, mesmo quando uma delas estava se passando pela outra (chupa, gêmeas Olsen). O interessante era que, apesar de Mulheres de Areia saber a hora de fazer humor, ela não se poupava de uma trama mais pesada, com cenas bem fortes e reviravoltas.
26 — Deus Salve o Rei
Essa foi uma novela ruim. Meu Deus do céu como ela foi ruim. E eu amei cada segundo. Deus Salve o Rei ressuscitou as vibes de Que Rei Sou Eu e trouxe um enredo medieval com figurinos questionáveis e a absoluta certeza de não se levar a sério nunca. As pessoas só comiam caldo. A geografia não fazia sentido. O texto era uma barbaridade. Lembro que comecei a ver com vários amigos que escreviam fantasia e todos foram abandonando a novela com o passar das semanas, até sobrar apenas eu. O que eu lamento de verdade, porque Johnny Massaro brilhou e roubou todo o protagonismo (eu cheguei a ir vestida como o personagem dele em uma festa à fantasia). Essa também foi uma novela em que Bruna Marquezine recuperou a simpatia do brasileiro, logo depois de se separar do Neymar. Ponto extra para os conteúdos que o elenco gravava nos bastidores, incluindo um funk que eu devo saber cantar até hoje. Essa novela foi um delírio. UM DELÍRIO. Você devia assistir.
25 — Mulheres Apaixonadas
Talvez tenha sido aqui que eu vivi a minha primeira experiência noveleira completa. Eu comprei o CD com as trilhas sonoras com meus próprio dinheirinho. Eu lia as revistas de fofoca para saber o que acontecia. Mulheres Apaixonadas já figuraria nessa lista só pelo apego afetivo, mas também por ser uma ótima novela. Tinha romance com padre ao som de Imbranato. Tinha idoso sendo agredido e atriz sendo agredida na rua por ter agredido o idoso. Tinha Dan Stulbach se consagrando como vilão com uma raquete de tênis. Tinha a baby Bruna Marquezine desidratando de tanto chorar.
24 — Alma Gêmea
E seeeee a gente chamasse a Priscila Fantin para interpretar uma indígena que é a reencarnação da esposa morta de um ricaço muito mais velho que ela?? Te pareceu uma péssima ideia? Bom, não foi o que Walcyr Carrasco pensou. E embora o casal principal fosse um grande picolé de chuchu ao som de Fábio Júnior, Alma Gêmea nos presenteou com uma das melhores vilãs da teledramaturgia, com direito a cena no inferno e tudo. PELAS JOIAS DE TITIA! Cristina, você nunca será esquecida.
23 — O Rei do Gado
Sei que é controverso colocar uma novela tão tradicional na rabeta da lista, mas nunca consegui gostar de Antônio Fagundes como galã contracenando com mocinhas tão descaradamente mais jovens. Acho que fiz parte da geração intermediária que passou a ver isso como um problema, mas que ainda consumiu muitas obras assim. Porém, reconheço a importância da novela, principalmente na pauta do MST e por nos dar a dupla Pirilampo e Saracura. Fora que é aquela coisa: briga de família que perdura por gerações? Tô dentro.
22 — Porto do Milagres.
Odoyá, minha mãe. A fala, sempre repetida pelo pescador Guma, foi tão marcante quanto a música de abertura da novela. Lembro que a trama era simples, sem grandes reviravoltas, mas era tudo tão BONITO e tão BRASILEIRO. Era uma novela que não era de época e não se passava no Leblon! Que citava orixás! Também foi onde aprendi que Deus tem seus favoritos e que Marcos Palmeira e Camila Pitanga estão nesse time.
21 — Esperança
Conhecida pelos íntimos como Terra Nostra parte 2, Esperança foi uma daquelas novelas de época de manual: abertura marcante, dramalhão com muito romance, fatos históricos adaptados livremente, figurante pra caralho, tudo no lugar. Em comparação com Terra Nostra, dá para ver que ela carece de alma, mas não deixou de entreter mesmo assim. Tinha Fernanda Montenegro, Laura Cardoso e Eva Wilma na mesma novela, além de fábrica de tecelagem com patrão abusivo, pensão onde rolava fofoca, plot de guerra e tudo aquilo que meu povo gosta. E eu queria que a Simone Spoladore fizesse parte do elenco de qualquer produção de época.
20 — Renascer
Baixei a posição da novela em consideração não ao que Renascer foi, mas ao que PODERIA SER. Uma das novelas que eu mais quis “ajeitar com minhas próprias mãos". Assim como Esperança, ela também perde o brilho quando comparada à irmã mais velha, Pantanal. Mas a premissa é ótima. Briga de irmãos, componente fantástico afiado (com direito a diabinho na garrafa e tudo), novela com fase passado/presente, ambientação rural, personagens marcantes e uma fotografia e uma trilha sonora digna de superproduções. Tem muita coisa que funciona nessa novela, e essa cena em especial foi uma das coisas mais bonitas e emocionantes que eu já vi. A maioria das atuações eu precisei aplaudir no sofá da minha casa. Mas, infelizmente, o remake se perdeu ali pelo meio, criou umas barrigas e fez uma das coisas que eu menos sei perdoar — colocou os personagens para agirem contra a própria personalidade a fim de alongar o enredo. Enfim, eu poderia passar uma hora inteira palestrando sobre Renascer, mas digamos que, se fosse cuidada com mais carinho, essa novela tinha o potencial de ser minha favorita absoluta. Mas ela tá em vigésimo. O que significa que eu sou rancorosa.
19 — Da Cor do Pecado
Essa foi uma novela afetiva para o brasileiro. Não sei explicar por que ela caiu tão bem, mas 10 a cada 10 noveleiros amam essa história. Seria o carisma de Taís Araújo e Sérgio Malheiros (que virou a criança mais amada do Brasil durante um tempo)? Ou seria o humor duvidoso de Mamuska e seus sei lá quantos filhos e respectivas namoradas de chiquinhas? Ou o apelo de ter Reynaldo Gianecchini interpretando gêmeos? As pilantrices de Pai Helinho sendo atormentado pelo espírito do marido falecido de Tancinha? Não sei, mas algo ali deu liga. Tipo aquelas receitas que você cria por acidente.
18 — Roque Santeiro
Um clássico é um clássico. Essa eu vi no Vale a Pena Ver de Novo e me apaixonei. Não entendo por que as pessoas celebram tanto Regina Duarte como as Helenas do Manoel Carlos quando ela é tão melhor sendo a Viúva Porcina. Além dos personagens icônicos e dos bordões inesquecíveis, Roque Santeiro também é um dos grandes representante de um dos gêneros de novela que eu mais amo — a cidadezinha fictícia que vive no realismo mágico do absurdo (vou incluir aqui uma menção honrosa a Saramandaia e O Bem-Amado). O brasileiro adora uma trama com elemento fantástico e nem se dá conta disso. Tô certa ou não tô?
17 — Cabocla
Brejeira, romântica, engraçada, de época, sem grandes pretensões além de divertir. Outra dessas novelas que era um abraço de mãe depois de um dia de trabalho. Vanessa Giácomo conquistou todo mundo como Zuca, mas eu diria que o destaque mesmo foi para Malvino Salvador e Eriberto Leão — não apenas um, mas DOIS galãs surgidos do nada com uma trama toda focada em sofrer de amor. Realmente uma novela que não economizava nos ships.
16 — Sinhá Moça
Se você não olhar com atenção vai achar que ainda está assistindo Cabocla — inclusive porque o elenco é o mesmo —, e foi realmente difícil decidir qual viria na frente. Mas resolvi ceder a vitória para Sinhá Moça por causa da trama abolicionista e do mistério de Ana do Véu. Se tem algo que eu admiro na grande tradição noveleira deste país é dar um mistério para a audiência resolver. Lembro até hoje do dia em que vimos a cara da Ísis Valverde pela primeira vez.
[CONTINUA]
Eu precisava vir aqui só pra comentar q sua newsletter é sempre um deleite mas essa me fez gargalhar. Não, eu NÃO assisto novelas (não tenho paciência nem pra séries 😅), mas terminei pensando: que delícia ser brasileiro e ter novela no país 😂 amei e já vou compartilhar com as amigas noveleiras
Já eu nunca entendi a comoção com Avenida Brasil... Achei apenas ok? Sou fã de A Favorita, jamais esquecerei o dia que a Flora revelou que era a verdadeira vilã!!!